Data da publicação: 24/10/2024
Com foco nas mudanças climáticas e na dispersão de sementes, a publicação ressalta a necessidade de estratégias de restauração adaptadas regionalmente
Estudo recente traz informações valiosas que podem apoiar os esforços de restauração ecológica, particularmente em áreas severamente impactadas pelo desmatamento e degradação da vegetação nativa. Entre outras conclusões, os autores do artigo Spatio-temporal variability in seed production of tree species: implications for restoration in the Cerrado–Amazonia transition zone (Variabilidade espácio-temporal na produção de sementes de espécies arbóreas: implicações para a restauração na na zona de transição Cerrado-Amazônia) publicado na revista Restoration Ecology reforçam a importância das redes de coletores, como a Rede de Sementes do Xingu (RSX), e das zonas de transição.
“Ao colaborar com comunidades indígenas e tradicionais, as iniciativas de restauração podem garantir que uma gama diversificada de espécies nativas seja utilizada nos projetos de reflorestamento, aumentando a resiliência ecológica das áreas restauradas”, diz o artigo sobre o estudo liderado pela engenheira florestal Aline Ferragutti e equipe de pesquisadores.
Principais Descobertas
O artigo é resultado da análise dos dados de dispersão de sementes de 139 espécies de árvores da área de transição Cerrado-Amazônia registrados durante oito anos. A região faz parte da Bacia do Xingu, que enfrenta crescente pressão do desmatamento, expansão agrícola e mudanças climáticas, tornando a restauração de áreas degradadas essencial.
Os pesquisadores descobriram que os padrões de dispersão de sementes variaram significativamente ao longo do tempo e do espaço. De acordo com estudo, espécies de ambos os biomas apresentaram períodos prolongados de dispersão de sementes, especialmente no final da estação seca e início da estação chuvosa, quando as condições para que as sementes germinem e se desenvolvam são ideais.
“Curiosamente, o desenvolvimento em ambos os biomas foi semelhante, revelando o potencial de uso dessas espécies de forma intercambiável”, afirmam os autores.
O estudo também confirmou o que temos testemunhado com frequência cada vez maior: que as mudanças climáticas em curso podem perturbar os padrões naturais de dispersão de sementes, com possíveis consequências negativas para os esforços de restauração.
“A restauração de áreas degradadas na zona de transição Cerrado-Amazônia é estratégica para mitigar o desmatamento na Amazônia e aumentar a resiliência dos ecossistemas. A oferta de sementes é um ponto crucial para iniciativas de restauração em grande escala, e esta pesquisa oferece soluções práticas para melhorar as estratégias de coleta de sementes. Compreendendo o tempo e a variabilidade espacial da dispersão de sementes, redes de sementes como a Rede de Sementes do Xingu podem otimizar os cronogramas de coleta para garantir um suprimento contínuo de sementes para projetos de restauração ao longo do ano”, destaca o artigo.
A publicação chama a atenção para o fato que a ARSX - parceiro-chave da pesquisa, coletivo de mais de 500 coletores de sementes de 24 grupos da região onde foi realizada a pesquisa, incluindo diversas comunidades indígenas, urbanas e de agricultores familiares - desempenha “papel essencial no fornecimento de sementes para a restauração ecológica, gerando também renda para as comunidades locais.
“Ao incorporar as descobertas deste estudo, a Rede de Sementes do Xingu pode aumentar sua capacidade de atender à crescente demanda por sementes nativas, que deverá aumentar à medida que o Brasil intensifica seus esforços para cumprir as metas de restauração estabelecidas na Lei de Proteção da Vegetação Nativa e em outros acordos internacionais”, afirmam os autores do artigo.
Década da ONU para a Restauração de Ecossistemas
Enquanto o mundo busca soluções inovadoras para restaurar ecossistemas sob a Década da ONU para a Restauração de Ecossistemas, o artigo informa que a zona de transição Cerrado-Amazônia no Brasil é um ponto crítico de biodiversidade, lar de espécies únicas de plantas e animais que estão cada vez mais ameaçadas pelas atividades humanas. A restauração eficaz nesta área é de extrema importância não apenas para a preservação da biodiversidade, mas também para a manutenção de serviços ecossistêmicos vitais, como a ciclagem da água, o sequestro de carbono e a regulação climática.
Os esforços para restaurar áreas degradadas nesta região podem servir de modelo para outras regiões tropicais que enfrentam desafios semelhantes. O foco do estudo na importância da variabilidade espaço-temporal da dispersão de sementes ressalta a necessidade de estratégias de restauração adaptadas regionalmente, levando em conta as condições climáticas locais e os padrões reprodutivos específicos das espécies.
Mais investimentos
Os autores do estudo reforçam a necessidade da continuidade do investimento em redes de sementes e no envolvimento das comunidades locais nos esforços de restauração. “Ao colaborar com comunidades indígenas e tradicionais, as iniciativas de restauração podem garantir que uma gama diversificada de espécies nativas seja utilizada nos projetos de reflorestamento, aumentando a resiliência ecológica das áreas restauradas”, afirma o artigo.
Aline Ferragutti é engenheira florestal,
mestra em ecologia e conservação da biodiversidade pela UNEMAT
e técnica do Redário / Instituto Socioambiental (ISA)
Fotos da matéria: Andréa Ono - Redário/ISA